domingo, 14 de dezembro de 2014

"Alma no Lodo" (1930)

(Little Caesar) De: Mervyn LeRoy, Com: Edward G. Robinson, Douglas Fairbanks Jr, Glenda Farrell, William Collier Jr, Stanley Fields. EUA – Policial – P&B - Warner Bros – 1930.

Segundo o professor de cinema Robert Sklar, havia no cinema mudo uma tradição de se fazer filmes sobre a cidade grande e os crimes das cidades grandes. O lendário diretor D.W.Griffith, por exemplo, levou às telas em 1912 o curta The Musketeers of Pig Alley, que podemos dizer, foi o primeiro filme de gangster da história do cinema. Em seguida, vieram os longas, Regeneration (1915) de Raoul Walsh, The Penalty (1920) de Wallace Worsley, Sacrifício Inútil (1927) de Frank Urson e Paixão e Sangue (1927) de Josef Von Sternberg. Depois disso, com o advento do som, os filmes em Hollywood foram se tornando produções cada vez maiores, o gênero policial não fugiu à regra, como podemos comprovar através da trilogia realizada no inicio dos anos 30 e que se tornou a precursora de todos os filmes de gângsteres existentes; Alma no Lodo (1930) de Mervyn LeRoy, Inimigo Público nº 1 (1931) de William A. Wellman e Scarface, a Vergonha de Uma Nação (1932) de Howard Hawks.

Eu quero estar aqui!

Esses três filmes, que revolucionaram o gênero, tinham em comum a critica ferrenha ao proibicionismo dos anos 20. Como se sabe, poucos anos após o termino da Primeira Grande Guerra Mundial, mais precisamente em 1920, uma emenda constitucional, o Ato Volstead ou Ato de Proibição Nacional, entrava em vigor nos Estados Unidos alegando que qualquer bebida com mais de 0,5% de teor alcoólico teria sua fabricação, venda, distribuição e consumo terminantemente proibidas. Apesar do rigor, a lei não conseguia conter o desejo dos americanos, que recorriam à clandestinidade em busca do álcool. Com isso, um novo tipo de crime passou a atender as necessidades da população através do “trabalho” de contrabandistas e de poderosos gângsteres, como o do notável ítalo-americano Al Capone. Capone, considerado o maior gângster dos Estados Unidos, por muitos anos foi o líder de uma organização criminosa dedicada ao contrabando e outras atividades ilegais durante a Lei Seca. Frio, violento e completamente sem escrúpulos, Capone controlava informantes, cassinos, destilarias e cervejarias, chegando a faturar mais de cem milhões de dólares por ano. Entre as autoridades da época, era conhecido como scarface, devido a uma cicatriz em seu rosto, portanto, qualquer semelhança com o título do filme de Hawks não é mera coincidência.

Caesar Enrico Bandello entre os chefões Pete Montana e Sam Vettori

Também não é mera coincidência com a vida de Al Capone a obra “Little Caesar” escrita em 1929 por W.R. Burnett, renomado novelista que mais tarde seria responsável pelos romances policiais “O Último Refúgio” (1941) [LEIA AQUI] e “O Segredo das Jóias” (1949). Burnett, que também se destacara como um excelente roteirista em Hollywood, assinando sucessos como o aclamado “Fugindo do Inferno” (1963), cresceu em Chicago e conheceu de perto as afliges causadas pelos gângsteres. Apesar de já ter escrito mais de cem contos e cinco romances, foi com Little Caesar que Burnett alcançou a notoriedade. Diante do sucesso, a Warner Bros, que era especialista em produzir dramas contemporâneos e sociais, adquiriu os direitos sobre o livro e imediatamente providenciou sua adaptação pra as telas. Francis Edward Faragoh, Robert N. Lee, Robert Lord e um não-creditado Darryl F. Zanuck foram os responsáveis por esse trabalho, que sem delongas, estava pronto para ser filmado. Produzido pelo competente Hall B. Wallis, cuja filmografia é repleta de obras-primas, (As Aventuras de Robin Hood, Vitória Amarga, O Falcão Maltês, A Canção da Vitória, Casablanca, etc), Alma no Lodo foi dirigido por Mervyn LeRoy, um exímio diretor que permaneceu sob contrato com a Warner até 1939, ano que se transferiu para a MGM. Com relação ao elenco, existem boatos que, a principio, Clark Gable interpretaria Rico, todavia, Jack Warner não aprovou a escolha e sugeriu Robinson, que havia acabado de filmar na própria Warner o filme policial The Widow From Chicago (1930). O já conhecido Fairbanks Jr ficou com o papel de Joe e a novata Glenda Farrell com o papel da dançarina Olga.

Rico demonstra sua força

A história de Alma no Lodo retrata a origem, o ápice e o declínio de Caesar Enrico Bandello (Robinson), um assassino frio e calculista que ao lado do amigo Joe Massara (Fairbanks Jr.) deixa os pequenos crimes do interior em busca da riqueza e do poder na cidade grande. Ambicioso e completamente prepotente, assim que chega à cidade, Enrico se une ao bando de Sam Vettori (Fields), um representante da máfia local que aparentemente vive como gerente da boate Palermo. Logo, “Rico”, como passa a ser chamado, assume o controle da gangue e rapidamente se torna um dos maiores mafiosos da cidade, enfrentando gangues rivais e a perseguição das autoridades. Em nenhum momento o filme menciona a cidade de Chicago e o proibicionismo de forma explicita, entretanto, é evidente que a trama, assim como na obra original, refere-se à vida de Al Capone.

E logo se torna o líder da organização criminosa

Ao ser lançado, apesar do sucesso entre o público, o filme dividiu opiniões e não foi muito bem recebido pela crítica. Muitos ficaram ultrajados porque um gângster estava sendo idealizado, e o público era encorajado a se identificar com ele. Como sabemos, em 1930 o código Hays ainda não havia sido criado, todavia, em 1954 quando o filme voltou as telas, para evitar problemas com a censura, a Warner providenciou o seguinte prólogo a fim de exterminar qualquer apologia aos mafiosos: "Talvez os mais fortes de todos os filmes de gângsteres “Inimigo Público nº 1 e “Alma no Lodo” tiveram um profundo efeito sobre a opinião pública. Eles mostraram violentamente os males relacionados ao Proibicionismo e sugeriram a necessidade de uma faxina nacional. Tom Powers de Inimigo Público nº 1 e Rico de Alma no Lodo não são homens, tampouco são meramente personagens: são um problema que cedo ou tarde, nós o público, teremos de resolver". Em contrapartida, é interessante ressaltar, que existem aqueles que vêem a obra de Burnett como uma alegoria aos negócios, em outras palavras, Alma no Lodo seria uma versão muito grotesca do empreendedor americano que, durante os anos 1920, achava que ia enriquecer cada vez mais a medida que a bolsa subia. É de fato uma visão bastante curiosa, no entanto, aceitável. Hoje, Alma no Lodo, Inimigo Público nº 1 e Scarface, A Vergonha de Uma Nação, são mais que grandes clássicos do cinema, juntos, esses filmes são os precursores de tudo que já foi filmado sobre gângsteres e sobre o proibicionismo americano. Se ao longo dos anos, o público pode conhecer filmes policiais como Bonnie e Clyde (1967), O Poderoso Chefão (1972), Era Uma Vez Na America (1984) e Os Intocáveis (1987) foi graças a inovação e ao trabalho de homens como Griffith, LeRoy, Wellman e Hawks, que nos primórdios do cinema criaram esse gênero que há mais de noventa anos continua em voga.

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Rico enfrentando as gangues rivais
O Banquete
Rico perseguindo Joe e Olga
Rico é perseguido
Eliminando os inimigos
Rico se torna alvo
Na Sarjeta
 Douglas Fairbanks Jr. em foto publicitária

Edward G. Robinson como Little Caesar

Cartaz original do filme

terça-feira, 22 de julho de 2014

"A Malvada" (1950)

(All About Eve) De: Joseph L. Mankiewicz, Com: Bette Davis, Anne Baxter, George Sanders, Celeste Holm, Gary Merrill, Hugh Marlowe, Thelma Ritter, Gregory Ratoff, Marilyn Monroe, EUA – Drama – P&B – Fox – 1950.

Em 1949, ao vencer seu primeiro prêmio Oscar de melhor diretor e melhor roteirista pelo filme Quem é o Infiel, o diretor Joseph L. Mankiewicz (1909-1993) encontrava-se sob contrato com a 20th Century Fox desde 1946, ano que estreou na direção com os suspenses Backfire, O Solar de Dragonwick e Uma Aventura na Noite. Antes disso, o diretor, que começou a carreira como produtor e roteirista em 1929, já havia trabalhado em mais de 55 produções na Paramount. Com uma carreira marcada por grandes sucessos, como O Fantasma Apaixonado (1947), [LEIA AQUI], Júlio César (1953), A Condessa Descalça (1954) e o já citado e premiado Quem é o Infiel (1949), Mankiewicz, que também amargou alguns fracassos como o malfadado, cansativo e literalmente faraônico Cleópatra (1963) e o desinteressante De Repente no Último Verão (1959), pode-se dizer, tornou-se um dos maiores cineastas estadunidenses de todos os tempos. Seu ápice sem dúvidas foi no final da década de 40 e inicio dos anos 50, quando consecutivamente levou para casa, em dose dupla, o maior premio da indústria cinematográfica, isto é, o Oscar de melhor diretor e melhor roteirista. No final de 1949, enquanto ainda desfrutava do sucesso de Quem é o Infiel, Mankiewicz diante do triunfo, recebeu do todo poderoso Darryl F. Zanuck (1902-1979), a missão de dirigir dois novos longas metragens no ano vindouro. Um deles já estava em pré-produção; O Ódio é Cego (1950), o segundo, que ainda era apenas uma ideia a ser aprimorada, tornou-se realidade após o diretor pegar em mãos uma velha edição de maio de 1946 da revista Cosmopolitan.

Eve Harrigton recebendo o prêmio Sarah Siddons 

Em meio ao seu conteúdo, a referida Cosmopolitan trazia aos seus leitores The Wisdom of Eve, um conto de nove páginas assinado por Mary Orr (1910-2006). Orr, que ao longo de sua vida viveu à sombra desse feito, publicara a história com base na amarga e verídica experiência da amiga Elisabeth Bergner (1897-1986), uma famosa atriz ucraniana que, no inicio dos anos 40 quase teve um importante papel numa peça, usurpado pela própria assistente, uma “pobre fã” que ela mesma compadecida empregou anos antes. The Wisdom of Eve veio de encontro com a ideia original de Mankiewicz, que a principio considerava trabalhar com a história de uma atriz de meia idade inconformada com o declínio de sua carreira. Notem que a ideia original do diretor, em muito se assemelha com o roteiro assinado por Billy Wilder (1906-2002) e Charles Brackett (1892-1969) para o filme Crepúsculo dos Deuses, [LEIA AQUI] lançado no mesmo ano. A pedido de Mankiewicz, a Fox pagou à Orr o irrisório valor de US$ 5000 pelo conto, que logo foi trabalhado e adequado para as telas. Concluídas as adaptações, estava definido, Best Performance seria o segundo filme dirigido por Mankiewicz em 1950 e Susan Hayward (1917-1975) novamente seria a protagonista, assim como foi em Sangue do Meu Sangue no ano anterior. Darryl F. Zanuck, por sua vez, satisfatoriamente aprovou o roteiro, entretanto, apontou algumas significativas mudanças na produção, entre elas o título do filme, que passou a ser All About Eve

"Muito bem querida agora você já tem o que colocar no lugar do coração"

Entre as demais mudanças apontadas por Zanuck, estava a substituição da musa de Mankiewicz. Segundo o produtor e presidente da Fox, Hayward era muito jovem para interpretar Margo Channing, ou seja, uma atriz “madura”. De fato, ele estava certo, uma vez que Eve, a vilã, a principio seria interpretada por Jeanne Crain (1925-2003), apenas oito anos mais nova. Para substituir Hayward cogitaram nomes que iam de Marlene Dietrich (1901-1992), Barbara Stanwyck (1907-1990) e Ingrid Bergman (1915-1982) às divas teatrais Tallulah Bankhead (1902-1968) e Gertrude Lawrence (1898-1952), entretanto, por fim a escolhida foi Claudette Colbert (1903-1996), que disponível, prontamente aceitou o convite. Todavia, faltando poucos dias para o inicio das filmagens, em abril de 1950, e com todo o elenco já definido, Jeanne Crain ao descobrir que estava grávida pede seu desligamento da produção, da mesma forma que Claudette Colbert após ferir gravemente as costas em um acidente. Diante dos imprevistos, Zanuck imediatamente escala, para viver Eve, a contratada do estúdio Anne Baxter (1923-1985). Baxter, após seis anos interpretando pequenos papéis, finalmente alcançou o estrelato em 1946 ao vencer o Oscar de melhor atriz coadjuvante por seu excelente desempenho em O Fio da Navalha. Como a ardilosa Eve Harrington, a atriz pode comprovar ainda mais seu talento através de uma interpretação que, sem dúvidas, se tornou o seu ápice. Para substituir Colbert e interpretar Margo, Zanuck convidou a premiada e renomada Bette Davis (1908-1989). Essa, após dezoito anos sob contrato com a Warner Bros, ao ler o roteiro de Mankiewicz se apaixonou pelo personagem e sem hesitar, disse sim. 

Margo e Birdie,  farpas e fidelidade

O Filme se inicia durante a cerimônia de entrega do prêmio teatral Sarah Siddons, cuja principal vencedora é Eve Harrington (Baxter). Entre os convidados encontram-se a estrela dos palcos Margo Channing (Davis) com seu noivo Bill Sampson (Merrill), o roteirista Lloyd Richards (Marlowe) com a esposa Karen Richards (Holm) e o cínico crítico Addison DeWitt (Sanders), que através de um minucioso flashback nos conta tudo sobre Eve; suas mentiras, suas intrigas e todas as artimanhas que lhe garantiram o sucesso. A partir desse fantástico flashback, a trama de A Malvada se resume em contar a maquiavélica história de Eve a partir do momento em que ela deixa de ser uma completa desconhecida, por intermédio de Karen que a leva até Margo, sua musa inspiradora e de quem ela finge ser fã unicamente com o intuito de usurpar seu lugar no trabalho e na vida pessoal. 


Karen Richards apresenta Eve a sua musa inspiradora

Lançado nos Estados Unidos no dia 13 de outubro de 1950, A Malvada foi um enorme sucesso de bilheteria e de crítica. Alavancou novamente a carreira de Bette Davis, que vinha de uma sucessão de filmes fracos na Warner e consolidou ainda mais o nome de Anne Baxter. Até 1997, quando James Cameron lançou seu aclamado Titanic, o filme de Mankiewicz permaneceu isolado no número de indicações ao Oscar, 14 no total. Desses, A Malvada levou 06 estatuetas, incluindo o de melhor filme, diretor e roteiro. Bette Davis, apesar de ter apresentado um dos melhores desempenhos de sua carreira, não levou o prêmio de melhor atriz. Um empate, assim como ocorreu em 1968 entre Barbara Streisand e Katharine Hepburn (1907-2003) era o que deveria ter ocorrido em 1950, uma vez que Gloria Swanson (1899-1983) também atuou magistralmente em Crepúsculo dos Deuses. Entretanto, ambas inacreditavelmente perderam para a novata Judy Holliday (1921-1965) que temos que convir, também apresentou um comovente trabalho no fraco Nascida Ontem. Além das indiscutíveis atuações de Davis e Baxter, também merecem destaques os desempenhos de Thelma Ritter (1902-1969) e Celeste Holm (1917-2012), indicadas ao Oscar como coadjuvantes, e George Sanders (1906-1972), vencedor como ator coadjuvante. Marilyn Monroe (1926-1962), que quase passa despercebida, faz uma pequena ponta como a srta Caswell. Além do exímio e premiado roteiro, repleto de farpas e acidez, também merece destaque em A Malvada a excelente trilha sonora do experiente Alfred Newman (1901-1970) e o figurino (vencedor do Oscar) assinado por Edith Head (1898-1981) que a propósito levou dois Oscar para casa em 1951, um por esse trabalho, de melhor figurino em preto e branco, e outro por Sansão e Dalila de melhor figurino colorido. Aclamado como um dos maiores clássicos de Hollywood, A Malvada é sem dúvidas um dos melhores filmes produzidos na década de 1950. Cult, para ver e rever e obrigatório em qualquer coleção.

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Bill  e Margo, relacionamento conflituoso
O Inicio da noite turbulenta
Com direito a recepções ríspidas
e muitos dry martines 
Diante do atraso de Margo, surge uma substituta
"Não vou me vender por um coquetel e um amendoim salgado"
O plano de Karen
O Noivado de Margo
O Elenco principal em foto publicitária
Bette Davis e George Merrill, amor dentro e fora das telas
Sanders e Baxter em foto publicitária
Bette Davis, inesquecível como Margo Channing
Cartaz original do filme

sábado, 8 de fevereiro de 2014

"As Aventuras de Robin Hood" (1938)

(The Adventures of Robin Hood) De: Michael Curtiz e William Keighley, Com: Errol Flynn, Olivia DeHavilland, Basil Rathbone, Claude Rains, Alan Hale, Eugene Paullette, Patrick Knowles, Ian Hunter, EUA – Aventura – Cor – Warner Bros. – 1938.  

Desde o lançamento do primeiro longa metragem sonoro de Hollywood - “O Cantor de Jazz” (1927) - e diante de seu imenso sucesso, a Warner Brothers, responsável pela produção do filme, passou a realizar uma sucessão de musicais extravagantes e altamente rentáveis. Todavia, após alguns anos, o novo gênero acabou por cansar o público, e a grande novidade que até então havia revolucionado a indústria fílmica, isto é, o som, também deixou de ser um chamariz ao se tornar algo corriqueiro. Diante disso, uma série de fracassos por pouco não leva à falência o estúdio de Burbank, que imediatamente encontra a solução para a escassez das bilheterias através de um novo, e polêmico, gênero cinematográfico. Durante os cinco primeiros anos da década de 1930, ou seja, no período que sucedeu a grande depressão americana, a Warner Bros, em meio à crise, alcançou notoriedade em Hollywood ao se tornar o primeiro estúdio americano a abordar, através de produções de baixo orçamento, problemas contemporâneos e sociais, como o proibicionismo e em consequência dele, o surgimento e o domínio dos gangsteres. Alma no Lodo (1930) foi o primeiro filme do cinema a retratar a gênese, o ápice e o declínio de gangsteres americanos e estrangeiros. Tão logo, o gênero “caiu” no gosto do público, da mesma forma como poucos anos depois também “caiu” nas garras da censura, fazendo com que novamente o estúdio se reinventasse. Para isso, um gênero que a muito estava esquecido foi trazido de volta; as superproduções swashbuckler, isto é, as superproduções capa-e-espada. 

James Cagney, pra que?

Como já foi dito anteriormente na resenha de “Capitão Blood” [LEIA AQUI], Lionel Barrymore e Robert Donat estrelaram os dois sucessos que trouxeram de volta o gênero swashbuckler, sendo respectivamente “A Ilha do Tesouro” (1934) e "O Conde de Monte Cristo" (1934). No inicio de 1935, como a Warner Bros já possuía os direitos sobre a opereta de 1891 chamada Robin Hood de DeKoven e Smith, o então conselheiro de histórias e figurinos do estúdio, Dwight Franklin, sugere a Jack Warner a produção de um novo filme sobre o herói inglês. Warner por sua vez, interessado no projeto, autoriza a realização do longa, cujo protagonista já havia sido escolhido com unanimidade; James Cagney. Todavia, durante a pré-produção do filme, Cagney se desentende com os produtores Hal Wallis e Jack Warner e acaba se desligando do estúdio; diante disso, e na ausência de outro astro para interpretar Robin, a Warner decide engavetar a trama. Naquele mesmo ano, entretanto, o que nem Jack Warner e qualquer outro executivo do estúdio imaginava, é que um nome completamente desconhecido iria se tornar do dia para a noite o mais novo astro de Hollywood. Errol Flynn, que acabara de estrelar na própria Warner, Capitão Blood, sob a direção de Michael Curtiz, surge como o arquétipo ideal das aventuras swashbucklerDiante do sucesso do ator e de um contrato renovado, finalmente “As Aventuras de Robin Hood” em breve deixaria de ser apenas um projeto para definitivamente se tornar realidade.

Robin Hood e Will Scarlett perambulam pela floresta de Sherwood

Com relação à lenda Robin Hood, a primeira menção de seu nome ocorreu ainda na idade média no poema “Pierce Plowman”, escrito por William Langland em 1377. Desde então, a fama do príncipe dos ladrões só foi crescendo, alcançando dimensões épicas ao longo dos séculos através da literatura, do teatro e do cinema. Os primeiros filmes a contarem a história do herói inglês foram rodados, acreditem, em 1908 e 1912. Em 1913, foi a vez do primeiro longa metragem (com 4 rolos) e em 1922 a primeira superprodução; “Robin Hood de Douglas Fairbanks”. Por muitos anos, a versão de Fairbanks sem dúvidas foi a melhor e a mais notória, entretanto, sua glória durou até 1938, ano em que a Warner Brothers lança As Aventuras de Robin Hood, o mais aclamado capa-e-espada de todos os tempos.  A trama se inicia com o seguinte prólogo: No ano da graça de 1191, quando Ricardo Coração de Leão partiu para expulsar os infiéis da Terra Santa ele entregou a regência de seu reino a seu amigo Longchamps e não a seu traiçoeiro irmão, o Príncipe João. Amargamente ressentido, João desejava que um desastre recaísse sobre o Rei para que ele com a ajuda dos barões normandos pudesse apoderar-se do trono, e então, em um dia de azar para os saxões...” o príncipe João (Rains) toma o poder e passa a aumentar os impostos para falsamente levantar o alto resgate de Ricardo (Hunter), que se encontrava cativo na Áustria. Diante da árdua situação dos saxões, surge Robin de Locksley (Flynn) juntamente com Will Scarlett (Knowles), João Pequeno (Hale) e Frei Tuck (Paullette) dispostos a enfrentar a tirania e a mão pesada do príncipe regente e de seu braço direito, Sir Guy de Gisbourne (Rathbone).  

Robin enfrenta a corte

Essa versão, cujo roteiro foi assinado pelos renomados Norman Reilly Raine e Seton L. Miller, que acabavam de sair respectivamente dos sucessos “A Vida de Emile Zola” (1937) e “Balas ou Votos” (1936) foi a mais fidedigna às verdadeiras baladas medievais e aos demais poemas escritos ao longo dos séculos. Todos os detalhes existentes nos épicos, ou seja, a luta de bastões entre Robin e João Pequeno, o torneio de arco e flecha e o episódio onde frei Tuck carrega Robin nas costas, estão presentes na trama dirigida magistralmente por Keighley e Curtiz.  Olivia De Havilland, que já havia trabalhado ao lado de Flynn em “Capitão Blood” (1935) e “A Carga da Brigada Ligeira” (1936), aqui interpreta Lady Marian, a protegida do príncipe João, prometida de Sir Guy de Gisbourne e o grande amor de Robin Hood. A química entre Flynn e DeHavilland deu tão certo, que nos anos seguintes estrelaram juntos mais cinco sucessos, destacando-se entre eles “Uma Cidade Que Surge” (1939) [LEIA AQUI] e “O Intrépido General Custer” (1941).  Ao final da produção, As Aventuras de Robin Hood custou à Warner, cerca de US $ 2 milhões, um valor altíssimo para os padrões da época; no entanto, ao ser lançado, no dia 14 de Maio de 1938, só nos Estados Unidos o filme arrecadou mais de US $ 4 milhões, se tornado a segunda maior bilheteria do ano. As deslumbrantes cores do Technicolor, a exímia direção de arte de Carl Jules Weyl e a fantástica trilha sonora do mestre Erich Wolfgang Korngold (premiadas com o Oscar) fazem do filme, que é sem dúvidas uma das maiores aventuras de todos os tempos, um espetáculo ainda mais colossal. Completamente atemporal, a versão de 1938 se sobressaí a todas as demais películas já produzidas sobre o príncipe dos ladrões.  Que nos perdoe Douglas Fairbanks, Kevin Costner ou Russell Crowe, mas se Robin Hood realmente existiu, duvido muito de que alguém se parecesse tanto com ele, quanto Errol Flynn. 

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Despertando a ira de Príncipe João e Guy de Gisbourne 
Lady Marian é cortejada por Robin
O inesperado banquete
O torneio de arco e flecha
E o participante Robin, disfarçado para não chamar a atenção
 Robin recebendo o prêmio de Marian antes de ser capturado
Após fugir, Robin invade o castelo... 
Enfrenta seu maior inimigo...
Em um duelo de tirar o folego... 
Até vencê-lo...
E libertar seu grande amor
Errol Flynn como Robin Hood
Cartaz original do filme
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